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Carola Ponto e Vírgula

Carola Ponto e Vírgula

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Olá a todos sejam bem-vindos a mais uma opinião. Hoje temos um dos livros referentes às leituras do mês de Outubro, mas que só o consegui concluir já durante este mês. A partir de certa altura ficou evidente que não valia a pena estar a apressar esta leitura, se depois no fim não tivesse absorvido nenhuma da imensa informação que este livro contém.

Falo-vos de “Homo Deus: História Breve do Amanhã” de Yuval Noah Harari da editora Elsinore. Este é o livro que sucede a “Sapiens: História Breve da Humanidade” do qual também já demos aqui a opinião. Se “Sapiens” se foca mais no estudo histórico do nosso passado, neste “Homo Deus” o foco situa-se no presente, mas principalmente na forma como esse presente irá afectar o futuro da espécie.

Gosto muito da forma como o autor nos vai apresentando dados estatísticos que acabam por contrariar a noção geral que temos do mundo que nos rodeia. Algumas delas deixam-nos mais optimistas, outras receosos e de boca aberta.

 

“Pela primeira vez na História, há mais pessoas a morrerem por comerem demasiado do que por não terem o que comer, há mais pessoas a morrerem de velhice do que de doenças infeciosas e o número de pessoas que cometem suicídio é superior ao número total das que são assassinadas por terroristas, soldados e criminosos. No início do século XXI, é mais provável alguém morrer por se empanturrar no McDonald’s do que por falta de água, devido ao Ébola ou num ataque da Al-Qaeda.”

 

“Em 2012, morreram cerca de 56 milhões de pessoas em todo o mundo. Destas, 620 mil pereceram devido à violência humana (a guerra matou 120 mil pessoas e a criminalidade matou 500 mil). Em contraste, 800 mil cometeram suicídio e 1,5 milhões morreram de diabetes. Hoje, o açúcar é mais perigoso do que a pólvora.”

 

 

Ninguém consegue dizer ao certo qual será o nosso destino nos próximos séculos, mas esse futuro chegará e com mudanças enormes, algumas fáceis de antecipar outras bem mais imprevisíveis.

 

“Claro que nem isto tudo é suficiente. Como a evolução não adaptou o Homo sapiens para a experiência constante do prazer e se é isso que, não obstante, a humanidade quer, será preciso mais do que gelados e jogos. Será necessário alterar a nossa bioquímica e redefinir artificialmente os nossos corpos e cérebros. E é isso que estamos a fazer. Pode discutir-se se é certo ou errado, mas parece que o segundo grande projeto do século XXI — o de garantir a felicidade geral — passará por reprogramar o Homo sapiens de modo a que este possa desfrutar do prazer infinito.”

 

Aquilo que julgámos serem as premissas que tornam os humanos diferenciados de todas as outras espécies (sentimentos, a noção de alma e uma individualidade, lá está, única), mais não são do que algoritmos. Ou seja, tudo isto transforma o ser humano numa base de dados enorme, mas que sem a base sentimental e única de cada indivíduo, poderá ser reprogramada e replicada por máquinas que possuem uma capacidade de processamento muito maior que a dos humanos. Assustador no mínimo…

“Normalmente, receia-se a mudança porque se tem medo do desconhecido. Mas a grande constante da História é que tudo muda.”

“Quem compreende realmente a teoria da evolução, percebe que a alma não existe. Isto assusta não apenas os cristãos e os muçulmanos devotos, mas também muitas pessoas sem qualquer crença religiosa em particular mas que, ainda assim, querem acreditar que cada ser humano tem uma essência individual eterna que não sofre alterações ao longo da vida e que permanece intacta mesmo após a morte.”

 

Pensar que daqui a 100 anos alguém irá olhar para estes dois últimos séculos como simples História e dados estatísticos e pensar: como é que eles não viram que isto iria acontecer?! Como é que isto alguma vez fez sentido para eles?! Parece que a História está condenada a repetir-se e da mesma forma que nós fazemos estas questões sobre os séculos passados, também irão no futuro olhar para nós do mesmo prisma.

“É assim que a História se desenrola. As pessoas tecem uma teia de sentido, acreditam nela de todo o coração, mas mais cedo ou mais tarde a teia desfaz-se e, quando olhamos para trás, não percebemos como é que alguém pode ter levado aquilo a sério. A esta distância, ir para uma cruzada na esperança de ganhar um lugar no Paraíso parece uma loucura. A esta distância, a Guerra Fria parece uma loucura ainda maior. Como é que há 30 anos havia pessoas dispostas a correrem o risco de um holocausto nuclear por causa da sua crença num paraíso comunista? Daqui a 100 anos, a nossa crença na democracia e nos direitos humanos poderá também parecer incompreensível aos olhos dos nossos descendentes.”

 

Chamar a atenção para uma história de um herói, desses sem capa, de nome Aristides de Sousa Mendes (história no fim deste post).

Seguimos o futuro a cada nova página e parece impossível, mas será cada vez mais uma certeza, que o Homo Sapiens será cada vez mais uma junção, perfeita ou talvez não, entre o ser humano e as máquinas.

 

“As experiências realizadas em Homo Sapiens demonstram que, tal como os ratos, também os humanos podem ser manipulados e que é possível, estimulando os locais certos do cérebro, criar ou eliminar até mesmo sentimentos complexos como o amor, a raiva, o medo e a depressão. As Forças Armadas dos Estados Unidos iniciaram recentemente experiências que passam pelo implante de chips no cérebro das pessoas, esperando que este método possa vir a ser utilizado no tratamento de soldados que sofrem de stress pós-traumático.”

 

Realmente eu tenho a sorte de ter uma tia-avó que me fala muito da sua vida na infância e de como tudo mudou desde essa época. Se imaginarmos que o crescimento tecnológico e o desenvolvimento que aí vem a um ritmo exponencial, as conversas que terei daqui a 30 anos com as crianças dessa altura, serão para eles quase como uma anedota.

 

“É precisamente pela velocidade a que a tecnologia avança na atualidade, e que deixa os parlamentos e os ditadores igualmente sobrepujados, que os políticos dos nossos dias pensam a uma escala muito mais reduzida do que os seus antecessores de há um século. Por essa razão, a política do início do século XXI está desprovida de planos grandiosos. Governar não é mais do que administrar. Os governos gerem os países, mas já não os lideram. Asseguram que os professores recebem a tempo e horas e que os sistemas de escoamento de águas não entopem, mas não fazem a mínima ideia de onde é que o país estará daqui a 20 anos.”

 

Por fim, somos deixados com três questões que ao início pareciam ter respostas evidentes, mas que depois de absorver toda a informação que está neste livro, se tornaram bem mais complicadas:

 

  1. Será que os organismos são apenas algoritmos e a vida não é mais do que processamento de dados?
  2. O que tem mais valor, a inteligência ou a consciência?
  3. O que acontecerá à sociedade, à política e à vida quotidiana quando os algoritmos não conscientes mas de inteligência superior nos conhecem melhor do que nós próprios?”

 

Para quem gosta de saber aquilo que o futuro, não nos esqueçamos, imprevisível, nos reserva, este livro é essencial. Anseio por ler “21 Lições Para o Século XXI” e sei que vou guardar este livro e revisita-lo daqui a umas décadas para perceber o quão reais eram as previsões.

Muito obrigado por estarem aí, boas leituras e até à próxima.

 

“O tecno-humanismo concorda que o Homo sapiens tal como o conhecemos já terminou o seu trajeto histórico e que, no futuro, deixará de ser relevante, mas conclui que, por isso mesmo, devemos usar a tecnologia para criar o Homo deus — um modelo humano bastante superior. O Homo deus manterá algumas características humanas essenciais, mas também beneficiará das capacidades físicas e mentais melhoradas que lhe permitirão defender a sua posição mesmo em relação aos mais sofisticados algoritmos não-conscientes. Visto que a inteligência se está a separar da consciência, e que a inteligência não-consciente está a avançar a um ritmo vertiginoso, os humanos terão e promover ativamente a melhoria das suas mentes, a fim de se manterem em jogo.”

 

“Na primavera de 1940, quando os nazis invadiram a França pelo Norte, uma grande parte da população judaica tentou fugir do país rumando a sul. Para passarem a fronteira precisavam de vistos de Espanha e de Portugal e, juntamente com milhares de outros refugiados, dezenas de milhares de judeus foram para a porta do consulado português em Bordéus numa tentativa desesperada de obter o papel que lhes salvaria a vida. O governo português proibiu os cônsules em França de emitirem vistos sem a aprovação prévia do Ministério dos Negócios Estrangeiros, mas o cônsul em Bordéus, Aristides de Sousa Mendes, decidiu ignorar essa ordem, mandando às malvas uma carreira diplomática de 30 anos. À medida que os tanques nazis se aproximavam de Bordéus, Sousa Mendes e a sua equipa trabalharam ininterruptamente durante dez dias, quase sem dormir, para emitir vistos e carimbar papéis. Sousa Mendes emitiu milhares de vistos antes de cair exausto.”