Olá a todos, bom fim-de-semana. Hoje é dia de falar do livro que escolhi para o The Bibliophile Club. Para o tema de Maio temos autores portugueses, um tema que sendo tão abrangente, nos deixa com um leque de escolhas enorme e isso é bom. Podemos ver que quase ninguém repete a mesma escolha e assim temos muitas opiniões novas.
Eu escolhi então “A Última Ceia” de Nuno Nepomuceno, edição da Cultura Editora. Primeiro que tudo, bela capa, depois e apesar de uma recordação vaga do último livro que li do autor, estava curioso por esta nova história até porque me lembrava de ter gostado muito de ler “O Espião Português”.
Nesta história temos um ladrão de arte, arrogante ao ponto de no seu último assalto deixar uma nota onde diz que irá repetir o feito no ano seguinte. Sem saber nada disto, Sofia, apaixona-se por este irresistível milionário e com o avançar da relação, futuro marido. É aqui que entra Afonso, antigo professor de Sofia e quem lhe conta toda as suspeitas em torno do seu futuro marido, Giancarlo. É aqui nesta altura que toda a história ganha forma, Sofia vê-se entre a espada e a parede, tendo que decidir se ajuda a investigação a alcançar as provas que incriminam o seu amor ou se segue esse amor tornando-se cúmplice das acções que ele tomar! Quase me esquecia, isto com cenários de fundo, como Lisboa, Milão e Londres. Tinha tudo para correr bem…
“Benedetta foi invadida pela estranheza assim que chegou ao interior do santuário. Uma cena que não conseguiu compreender imediatamente estava pintada perante os seus olhos.
Encontrou Jacopo sentado num dos bancos, de lado para o altar. Tinha as mãos atadas, o rosto ligeiramente ferido, o bigode ranhoso e os olhos a transbordar de infelicidade.
Bem à frente do homem, na grande parede lateral, via-se uma moldura vazia.
A mulher sentiu-se desfalecer ao compreender finalmente o que acontecera.
— Il Cenacolo! — gritou ela, horrorizada.
Um crime hediondo acabara de ser cometido. A beleza fora corrompida.
Alguém roubara A Última Ceia.”
E correu mesmo (agora ficaram com medo, eu sei )!
Adorei este livro, com capítulos curtos mesmo bom para nos manter colados e ansiosos pelo próximo e pelo próximo e pelo próximo, bem acho que já entenderam a ideia! Gostei muito das personagens, da forma inteligente como o autor as foi interligando, tendo todas o seu momento de algum protagonismo e importância. Gosto disso, que cada personagem sirva para alguma coisa e que eu não chegue ao fim do livro sem saber o que é que algumas andaram lá a fazer!
“Afonso chegou ao auditório do parque. Como esperara, estava vazio. O Sol punha-se; o frio da noite acentuava-se; já ninguém queria ficar ali.
Uma presença há muito anunciada surgiu do outro lado. O seu anfitrião vestia uma gabardina cinzenta, rondava a sua idade e, apesar da distância que os separava não permitir que lhe visse os olhos, o professor sabia que eram azul-claros, frios, como a neblina numa manhã de nevoeiro. O homem deu o primeiro passo e começou a descer os degraus em direção a ele.
Afonso imitou-o, apertando mais a alça da pasta que levava na mão. O seu oficial de ligação nos serviços secretos portugueses queria falar-lhe.
Coisa boa não deveria ser, de certeza.”
Claramente vou ter que voltar a ler “O Espião Português” e procurar ler toda a trilogia! Recomendo este livro, este autor, a todos quanto adoram uma boa aventura, com mistério, com cenários e temas históricos como pano de fundo e lá está, uma escrita muito boa que nos mantêm pregados página após página.
Quanto ao The Bibliophile Club, quem quiser junte-se a nós, é grátis, é divertido e falamos sobre os livros! Acho que não é preciso dizer mais, pois não?! Espero que se juntem a nós, que quem lá está, continue e que o tema do próximo mês me traga outra boa leitura! Até lá, comentem, digam os livros que leram neste mês, beijinhos e abraços do tio (sim, eu tenho que dizer que sou tio, logo homem, por já mais que uma vez acham que o Carola é de menina! Sendo que é “só” o apelido do tio que gere este blogue!).
“— há uma verdade imutável no mundo dos ladrões de arte, Afonso. Há quem o faça por despeito, muitos por vingança, ou por vaidade, quem sabe. Mas existe um motivo que é comum a todos. Não imagina qual será?
O professor abanou a cabeça, sentindo-se ignorante. Quando o seu oficial de ligação lhe falara do roubo de A Última Ceia, achara-se minimamente competente para lidar com o assunto. Não pensara assim devido à educação católica rigorosa que recebera em criança, mas também devido ao interesse que sempre sentira pela religião em geral. Sabia o que a obra de arte representava, o significado que aquelas figuras encerravam.
Porém, as palavras do POC ganhavam agora um novo sentido. Havia, de facto, muito a aprender com aquele velhote enfermo. Não poderia estar mais longe do seu habitat natural.
— Os ladrões roubam arte essencialmente por uma razão, Afonso — continuou ele.
— Qual é?
O antigo investigador arqueou as sobrancelhas. Não existiam. Tinham caído.
— Porque é fácil.”
“Tentado, aproximou-se de onde o vira desaparecer e olhou para dentro, na direção do pátio interior. Tentou abrir o trinco, mas este estava fechado. Nova desilusão. Agarrou-se às grades com as duas mãos. Fora vítima dos seus anseios. Procurava o pecado. Aquela era a forma que Maria, a mãe do perdão, encontrava para castigá-lo. Ao fim e ao cabo, não passava de um velho nojento e tolo.
Domenico sentiu uma presença súbita em frente a ele. Tentou largar o portão, mas foi tarde de mais. Um som agudo cortou o ar. Sentiu a primeira facada de seguida.
O arcebispo de Milão arquejou, vítima de vários golpes. Manteve-se agarrado às grades, frente a frente com o seu agressor, enquanto era esfaqueado múltiplas vezes na barriga.
Moribundo, largou-se finalmente, caindo sobre o pavimento da rua. Uma poça de sangue começou a formar-se no meio da escuridão em redor do corpo.
As vozes dos jovens que se divertiam nas esplanadas da marginal vieram até ele. A vida abandonou-o.”