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Carola Ponto e Vírgula

Carola Ponto e Vírgula

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Olá pessoal, como vão essas leituras? Hoje é dia de falar da minha escolha para o mês de Junho no The Bibliophile Club. Eu sei venho um pouco atrasado (a minha chegou-me a dizer que eu era atrasado por natureza, não sei é se tinha alguma coisa a ver com horas e datas) e peço desculpa por isso, mas demorei demasiado tempo a terminar o livro anterior a este. O tema do mês de Junho seria ler autores negros.

Eu nunca tinha olhado para os livros que tenho para perceber se tinha autores negros ou não. Alguns nomes são tão esquisitos que eu nem sei se são mulheres ou homens, mas reparei que sim é uma das lacunas da minha estante (poesia, por exemplo, é outra lacuna que ainda está por resolver).

No entanto, por sorte ou por azar, tinha lido em Maio “Se Esta Rua Falasse” de James Baldwin e adorei esse livro. Mas a verdade é que fiquei sem nenhum livro para o tema de Maio. Sendo assim, e como a indecisão aperta muito na hora de escolher, decidi comprar logo dois (quem nunca?!) e deixei que os seguidores no Instagram votassem e assim escolhessem por mim. Tínhamos então “Sou Um Crime” de Trevor Noah e “O Ódio que Semeias” de Angie Thomas. Este último ganhou a votação e é dele que vamos falar agora!

Temos então “O Ódio que Semeias” (título original: The Hate U Give”) de Angie Thomas, editado em Portugal pela Editorial Presença.

 

“— Porque é que estás sempre a ouvir estas velharias?

— Pá, cala-te! O Tupac é que era.

— Sim, há vinte anos.

— Não, mesmo agora. Tipo, ouve isto. — Ele aponta para mim, o que significa que está prestes a mergulhar num dos seus momentos filosóficos. — «O Pac disse que “Thug Life” significa que “O Ódio que Tu Semeias na Crianças Lixa Toda a Gente”».”

T-H-U-G L-I-F-E, em inglês, The Hate U Give Litlle Infants Fucks Everybody.

 

 

 

Nesta história temos a jovem Starr que do alto dos seus 16 anos deambula por dois mundos completamente opostos: vive num bairro problemático típico, com gangues, drogas e muita confusão à mistura no dia-a-dia daqueles negros que lá vivem. Por outro lado, estuda numa bela escola de uma zona residencial, recheada de estudantes brancos em que ela é o contraste da maioria.

Como se isto não fosse suficiente, Starr, vê o seu amigo de infância Khalil ser alvejado pela Polícia sem nenhuma razão!

 

“Já vi isto acontecer repetidas vezes: uma pessoa negra é morta simplesmente por ser negra, e o mundo desaba. Já publiquei no Twitter hashtags a dizer RIP, já republiquei fotografias no Tumblr e assinei todas as petições que existem. Sempre disse que, se visse aquilo acontecer a alguém, seria a voz mais audível, que me certificaria de que o mundo inteiro ficava a saber o que tinha acontecido.

Agora eu sou essa pessoa e tenho demasiado medo de falar.”

 

A partir daqui temos o relato dela enquanto tenta equilibrar toda a sua vida entre escola, bairro, falar em tribunal e exigir justiça pelo seu amigo desaparecido.

Infelizmente, isto é das coisas mais comuns nestes bairros, que como em todo o lado, têm pessoas boas e pessoas más e que não é por serem mais desfavorecidas que as outras que merecem morrer às mãos de certos polícias que não sabem fazer o seu trabalho!
Depois temos todos os meios de comunicação a serem usados, como sempre, a favor dos mais fortes em detrimento dos mais fracos.

Esta foi uma das coisas que mais gostei neste livro, mete o dedo na ferida. Sem medo, sem vontade de pintar a realidade de outra forma que não esta: injusta para com os mais fracos.

 

“— Porque é que ele era traficante de droga? Porque é que tantas pessoas do nosso bairro são traficantes de drogas?

Lembro-me do que o Khalil disse — que se cansou de escolher entre ter luz ou comida.

— Precisam de dinheiro —respondo. — E não têm muitas outras formas de o conseguir.

— Certo. Falta de oportunidades — diz o meu pai. — As empresas americanas não trazem empregos para as nossas comunidades, e não fazem nenhum esforço para nos contratar. Raios, mesmo que uma pessoa tenha terminado o ensino secundário, tantas das escolas dos nossos bairros não nos preparam suficientemente bem. É por isso que quando a tua mãe falou sobre mandar-te e aos teus irmãos para a Williamson, eu concordei. As nossas escolas não recebem recursos necessários para se equiparem como a Williamson. É mais fácil encontrar crack do que uma boa escola por estas bandas.

» Pensa — diz ele. — Como é que as drogas chegaram ao nosso bairro? Estamos a falar de uma indústria multimilionária, querida. Essa merda é transportada para as nossas comunidades, mas eu não conheço ninguém que tenha um avião particular. E tu?

— Não.

— Exato. As drogas vêm de algum lugar, e estão a destruir a nossa comunidade — diz ele. —Temos gente como a Brenda, que pensa que precisa delas para sobreviver, e depois temos os Khalis, que acham que precisam de as vender para sobreviver. As Brendas não conseguem um emprego a menos que estejam limpas, e não podem pagar a reabilitação a não ser que tenham trabalho. Quando os Khalils são presos por venderem drogas, passam a maior parte da vida na prisão, outra indústria milionária, ou têm dificuldade em conseguir um emprego de verdade e provavelmente começam a vender drogas outra vez. É esse ódio que estão a dar-nos, querida, um sistema que foi projectado contra nós. É isso a «Thug Life».”

 

As personagens tão bem construídas e todas têm o seu momento para “brilhar”.

Acho que é um livro absolutamente essencial a todos, mas muito focado nos jovens, para que se conheça as dificuldades por que passam as pessoas que vivem naqueles bairros e para que também eles se possam educar de forma a conseguirem perceber tudo aquilo que os rodeia e saberem que há muitas outras hipóteses disponíveis para eles e para todos.

 

“— O meu filho adorava trabalhar naquele bairro — diz o pai do Cento e Quinze. — Ele sempre quis fazer a diferença nas vidas daquelas pessoas.

Que engraçado. Os donos de escravos também achavam que estavam a fazer a diferença na vida das pessoas negras. A salvá-las dos seus «modos africanos selvagens». A mesma merda, outro século. Gostava que as pessoas como eles parassem de pensar que as pessoas como eu precisam de ser salvas.”

 

 

Este livro é daqueles que devia ser entregue a cada aluno de cada escola do mundo e lido dentro da sala de aula, em alto e bom som, para que todos, brancos, negros, altos, baixos, magros ou gordos, nos saibamos respeitar nas nossas diferenças e apreciar nas nossas semelhanças.

E vocês que livro é que leram para o tema deste mês?! Acham que alguma vez será possível acabar com grande parte destes problemas?! Comentem aí. Eu volto nos próximos dias para divulgar a minha escolha para o tema de Julho! Espero por vocês, muito obrigado e até à próxima!

 

“— Se o agente Cruise estivesse aqui sentado — diz a Sra. Carey —, o que é que lhe dirias?

Pisco várias vezes os olhos. A minha boca enche-se de saliva, mas engulo. Não me vou permitir chorar ou vomitar só de pensar naquele homem.

Se ele estivesse aqui sentado, nem o Jesus Negro seria suficiente para me fazer dizer que o perdoaria. Em vez disso, provavelmente dava-lhe um murro. Sem pensar.

Mas a sra. Ofrah diz que esta entrevista é a minha forma de lutar. Quando lutamos, arriscamo-nos, sem nos importarmos com quem magoamos ou se nos magoamos a nós mesmos.

Então lanço mais um golpe, direito ao Cento e Quinze.

— Perguntava-lhe se desejava também ter disparado sobre mim.”

 

 

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